Quando tudo for pedra,
atire a primeira flor; Quando tudo parecer caminhar errado, seja você a tentar
o primeiro passo certo;
Se tudo parecer escuro, se
nada puder ser visto, acenda você a primeira luz, traga para a treva, você primeiro,
a pequena lâmpada;
Quando todos estiverem
chorando, tente você o primeiro sorriso; talvez não na forma de lábios
sorridentes, mas na de um coração que compreenda, de braços que confortem;
Se a vida inteira for um
imenso não, não pare você na busca do primeiro sim, ao qual tudo de positivo
deverá seguir-se;
Quando ninguém souber
coisa alguma, e você souber um pouquinho, seja o primeiro a ensinar, começando
por aprender você mesmo, corrigindo-se a si mesmo;
Quando alguém estiver
angustiado à procura, consulte bem o que se passa, talvez seja em busca de você
mesmo que este seu irmão esteja;
Daí, portanto, o seu deve
ser o primeiro a aparecer, o primeiro a mostrar-se, primeiro que pode ser o
único e, mais sério ainda, talvez o último;
Quando a terra estiver
seca, que sua mão seja a primeira a regá-la;
Quando a flor se sufocar
na urze e no espinho, que sua mão seja a primeira a separar o joio, a arrancar
a praga, a afagar a pétala, a acariciar a flor;
Se a porta estiver
fechada, de você venha a primeira chave; Se o vento sopra frio, que o calor de
sua lareira seja a primeira proteção e primeiro abrigo.
Se o pão for apenas massa
e não estiver cozido, seja você o primeiro forno para transformá-lo em
alimento.
Não atire a primeira pedra
em quem erra. De acusadores o mundo está cheio; nem, por outro lado, aplauda o
erro; dentro em pouco, a ovação será ensurdecedora;
Ofereça sua mão primeiro
para levantar quem caiu; sua atenção primeiro para aquele que foi esquecido;
seja você o primeiro para aquele que não tem ninguém;
Quando tudo for espinho,
atire a primeira flor; seja o primeiro a mostrar que há caminho de volta,
compreendendo que o perdão regenera, que a compreensão edifica, que o auxílio
possibilita, que o entendimento reconstrói.
Atire você, quando tudo
for pedra, a primeira e decisiva flor.
(Glácia Daibert)